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Goma Gringa Discos

THIAGO FRANÇA "MALAGUETA, PERUS E BACANAÇO" • gglp-003

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Inspirado no conto "Malagueta, Perus e Bacanaço" do livro homônimo do escritor João Antônio, Thiago França - acompanhado da nata da cena paulista atual - apresenta o seu novo disco, nascido como homenagem aos 50 anos da publicação do livro.

Entre causos, códigos e personagens, somos apresentados aos três malandros que vagam na noite paulistana pelos salões de sinuca em busca de jogo. Um relato tipicamente paulistano, cru, cinzento e pouco esperançoso, onde a cidade é pano de fundo e personagem da trama que envolve seus protagonistas.

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O DISCO E A CAPA

• Edição limitada de 300 cópias numeradas.
• Apresentada pela primeira vez desde 50 anos no formato capa dura empastada, tipico dos anos 50 e 60.
• Impressa em LetterPress (tipografia) pelo Estudio Carimbo.
• Impressão 1x0, uma cor - preta - sobre papel Polen (capa) e papel fosco alta alvura (contra-capa).
• Arte assinada por Julio Dui.
• As 100 primeiras cópias vieram com o Cd bônus “Nos Bastidores de Malagueta, Perus e Bacanaço”. Cinco faixas de referências que foram utilizadas como base de trabalho pelos 13 participantes do disco. Gravações caseiras, acústicas e intimistas.

FICHA TÉCNICA

A1. MALAGUETA, PERUS E BACANAÇO (Thiago França)
A2. PICARDIA (Bacanaço) (Thiago França, Rodrigo Campos, Marcelo Cabral)
A3. CASO DO BACALAU (Kiko Dinucci, Rodrigo Ogi)
A4. SÃO PAULO DE NOITE (Thiago França)
A5. TEMA DO CARNE FRITA (Thiago França)

B1. NOSTALGIA (Perus) (Thiago França)
B2. NA MULTIDÃO (Kiko Dinucci, Romulo Fróes)
B3. BOLERO DE MARLY (Thiago França)
B4. FOME (Malagueta) (Thiago França)
B5. VILA ALPINA (Rodrigo Campos)
B6. DE VOLTA À LAPA (Thiago França)

Produzido por Thiago França.
Com o auxílio luxuoso de Romulo Fróes, Kiko Dinucci, Marcelo Cabrale Rodrigo Campos.

Thiago França - Sax tenor, alto, soprano, flauta e pocket piano (A3)
Anderson Quevedo - Sax barítono
Amilcar Rodrigues - Trompete e flughel
Didi Machado - Trombone
Welington "Pimpa" Moreira - Bateria e percussão
Marcelo Cabral - Cavaquinho, guitarra (A2, A4, B1, B2) violão (A5, B5), locução (B1) e voz (B5)
Kiko Dinucci - Guitarra (A2, B1, B3, B4), voz (A3), violão (A3, B2) e percussão (B5)

Participações Especiais:
Daniel Ganjaman - Hammond (A2, B1)
Rodrigo Ogi - Voz (A3)
Juçara Marçal - Voz (B2)
Romulo Fróes - Locução (B4)
Maurício Pereira - Locução (B6)

Gravado, mixado e masterizado por Carlos Lima no estúdio YB.
Projeto gráfico: Julio Dui_Mono
Produção Gráfica: Frederic Thiphagne

JOÃO ANTÔNIO RI por Romulo Fróes

Como um compositor de canções, sempre foi um mistério para mim a inspiração de quem compõe música sem letra e me intriga ainda mais a escolha de seus títulos. Como nomear algo tão abstrato e aberto quanto um tema instrumental? Lembro da inventiva maneira encontrada por Moacir Santos para dar nome a seus lindos temas lançados no antológico Coisas, chamando-os simplemente assim, coisas e numerando cada Coisa, de um a dez, para diferenciá-las entre si. O desafio a que Thiago França se propôs com este disco que lança agora, é para mim ainda maior. Como traduzir musicalmente o texto brilhante e original do conto Malagueta, Perus e Bacanaço, a obra-prima do escritor paulistano João Antônio? Qual era o batuque tocado pelo engraxate em sua caixa? Qual o som de uma bola de bilhar encaçapada? Qual a música ouvida nos salões de sinuca frequentados por seus personagens na Lapa, Água Branca, República ou Pinheiros? Mais ainda, qual o som das ruas da São Paulo de 1963? Um dos acertos de Malagueta, Perus e Bacanaço, o disco, é escapar a este impulso memorialista. Mais do que uma simples trilha sonora para o conto de João Antônio, Thiago França busca reinterpretá-lo a partir de sua própria linguagem musical.

Valendo-se da estória como roteiro, Thiago nos apresenta aos protagonistas na primeira faixa do disco, Malagueta, Perus e Bacanaço (Thiago França), homônima ao conto. De andamento cadenciado, conduzida por um cavaquinho monocórdico, a melodia é construída aos poucos a partir de um trombone um tanto preguiçoso, cambaleante, até que este se junte ao naipe de metais. Se quisermos, para aproximá-lo do conto de João Antônio, atribuir fisionomia ao tema composto por Thiago França, podemos imaginar o cavaquinho como o narrador da estória e os instrumentos do naipe assumindo as vozes de seus personagens. Notadamente o saxofone de Thiago, que lidera o naipe qual Bacanaço a seus parceiros. Na faixa seguinte, Picardia (Thiago França), podemos sentir o deslocamento desses personagens em busca de jogo. O duelo entre bateria e guitarra imprime tensão e pressa a essa busca. O naipe se mantém a distância, como se estivesse estudando o jogo de seus adversários. Ao longo do disco, Thiago compõe temas climáticos que aludem aos ambientes e sensações retratados no conto e que nos aproxima do imaginário de João Antônio. Estão ali o vazio e o abandono de São Paulo de Noite (Thiago França), o cansaço ao final da jornada noturna em De Volta a Lapa (Thiago França) e temas mais literais como Nostalgia (Thiago França) e Fome (Thiago França). Há lugar também para homenagens a personagens coadjuvantes, como a prostituta explorada por Bacanaço em Bolero de Marli(Thiago França) e o mítico jogador de sinuca Carne Frita (Thiago França), mencionado por João Antônio em seu conto.

Em sintonia com sua personalidade artística, Thiago abre espaço para canções em um repertório fundamentalmente instrumental e suas escolhas se mostram outro grande acerto do disco. Assim como acontece com os temas instrumentais, não se trata aqui de musicar o texto de Malagueta, Perus e Bacanaço, mas de tomá-lo como inspiração para novas composições. Na Multidão (Kiko Dinucci/Romulo Fróes), por exemplo, apesar de não se referir a nenhum episódio do conto, narra um acerto de contas que poderia muito bem ser protagonizado pelos malandros de João Antônio. Não é difícil imaginar tal fala na boca de um deles: "vou te amordaçar, vou provocar o teu silêncio, vou arremessar teu corpo azul, na multidão". Vila Alpina (Rodrigo Campos) traduz a personalidade individual de cada um dos protagonistas; seja expondo sua melancolia: "Malagueta velho triste, vai partir como chegou, barraco caindo pro lado de lá, vai desabar, barraco pendendo pro lado de cá"; seja revelando suas artimanhas: "o homem do prego falou, que relógio bom vai parar, mas Bacanaço jurou, o dente de ouro empenhar". Perus é o narrador da canção, e assim como no conto imagina na Vila Alpina sua Pasárgada: "Pra chegar na Vila Alpina vou de trem, vou devagar, vai melhorar esse jogo de azar, vai melhorar, vai melhorar esse jogo de azar". Dentre as canções do disco, Caso do Bacalau (Kiko Dinucci/Ogi) é a que mais se aproxima da sintaxe de João Antônio. Partindo do refrão escrito por Kiko, em tudo mais próximo de João Antônio: "desenxabido feito um coió, esqueceu da partilha e vacilou, a curriola já se mordeu, não lembrou da barganha e se queimou", Ogi desenvolve o episódio narrado no conto, sob uma rítmica influenciada pelo Rap, mas com uma acentuação e sotaque muito próprios. O modo como divide melodicamente alguns versos: "um malandro descendente de família ni-pô-ni-ca, que andava manco numa perna me-câ-ni-ca", o uso de gírias e interjeições e o modo como estes se integram ao texto: "é zóião de thundercat ho, é zoião rei momo engordurou, pela cidade eles vão lhe caçar, já já, já prometeram não amaciar, ha ha", imprimem à interpretação de Ogi um ritmo que podemos identificar no texto de João Antônio. Não como reprodução, mas talvez como uma atualização possível de sua prosódia. Não deixa de ser curioso imaginar o Rap como um desdobramento da linguagem criada por João Antônio.

O Malagueta Perus e Bacanaço de Thiago França, além de uma linda e merecida homenagem ao conto que acaba de completar cinquenta anos de seu lançamento, pode servir também como um convite para se conhecer a genial obra de João Antônio, tão brilhantemente traduzida e recriada neste disco.
E João Antônio ri.